Sebastião Cardoso

 

Um dos mais admirados e respeitados maçons brasileiros, o contador e economista Sebastião Cardoso, mineiro de Monte Carmelo, dono de um currículo invejável, completa 95 anos em dezembro. Já ocupou os mais elevados cargos na Maçonaria: Presidente, em três mandatos, da Excelsa Congregação dos Supremos Conselhos do Rito Escocês Antigo e Aceito (REAA) do Brasil, Secretário da Confederação Pan-Americana dos Supremos Conselhos do REAA; Presidente, por cinco vezes, do Consistório dos Príncipes do Real Segredo em Belo Horizonte, tendo sido o primeiro a ocupar o cargo; Soberano Grande Comendador do Supremo Conselho do Grau 33 para a República Federativa do Brasil, REAA, no período de 2003 a 2017; e Secretário do Sublime Capítulo Rosa Cruz Pelaio Alonso Perez, de Monte Carmelo.

Simpático e tranquilo, é um Naves que conheceu e teve o privilégio de conviver com parentes, alguns mais antigos, numa região onde a família tem grande presença, Monte Carmelo, cidade que já foi administrada, em gestões diferentes, por representantes de três gerações de familiares – José Cardoso Naves, Nilson e Saulo Faleiros. Sempre foi líder em seu meio e era convocado para as mais diversas campanhas, que acabava encabeçando e levando adiante. Quando jovem, diante das dificuldades de estudo, lutou pela criação do ginásio na cidade e, depois, de uma escola de comércio, para oferecer cursos profissionalizantes. Participou de diversas entidades e do movimento pela transformação do Triângulo Mineiro em Estado.

Bem-humorado, anotou eventos importantes de sua vida e dos familiares mais próximos, relatando-os para mostrar “uma família unida e respeitosa, solidária e que sempre valorizou os seus membros. Me sinto orgulhoso de dela pertencer e ser partícipe de grandes momentos”.

Em família

Filho de Anéia Naves Cardoso e Vicente Fernandes da Silva, casado com a conterrânea Marlene Soares Cardoso, tem cinco filhos: Túlio, Marcelo, Vicente, Lysia e Hermes, 11 netos (Túlio, Lucas, Matheus, Jader, Henrique, Gustavo Henrique, Ana Luísa, Ana Cristina, Ana Clara, Ana Carolina e Maria Eduarda) e seis bisnetos: Enrico, João, Arthur, Helena, Stella e Laura. Teve quatro irmãos: a professora e historiadora Maria Helena Fernandes Cardoso, carinhosamente conhecida como Dorinha e principal autora do livro “A História da Família Naves no Brasil”, e três já falecidos: Maria Terezinha, Geraldo e Vicentina, coautora da obra sobre os Naves.

Passou pela Escolas Reunidas de Douradoquara, no primeiro ano primário; Grupo Escolar Melo Viana; e Ginásio Nossa Senhora do Amparo. Fez o curso técnico de Contabilidade na Escola de Comércio ‘São Tomás de Aquino’, de sua cidade natal, e o Curso de Ciências Contábeis pela então Faculdade de Economia de Minas Gerais, de Uberlândia, MG, onde ingressou em 1964, integrando a sua segunda turma, que concluiu em 1968; no ano seguinte, por essa Faculdade, completou o Curso de Economia. É autor dos livros “Manual de Procedimento e Orientação”, para a Assembleia Legislativa do Grande Oriente de Minas Gerais; “Compêndio para os Corpos Filosóficos”, para o Supremo Conselho do Grau 33 para a República Federativa do Brasil, REAA, e “Chocarrices Carmelitanas – Monte Carmelo – Uvas de Deus”.

Sebastião com a família (Foto do álbum da Dorinha)

Caminhada

Sebastião começou sua trajetória como vendedor de verduras e engraxate. Foi ajudante e sacristão na Diocese de Monte Carmelo (1940 a 1947), ocasião em que participou de missas celebradas pelo padre Eustáquio (canonizado Santo), em 1941, que era vinculado à Diocese de Água Suja; e congregado mariano, pela Congregação Mariana de Monte Carmelo e seu vice-presidente. Foi professor e diretor no Colégio Comercial Monte Carmelo; e professor da Escola de Comércio São Tomás de Aquino. Membro efetivo do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais e seu Secretário e Diretor do Departamento Administrativo e Financeiro (período em que foi adquirida sua sede localizada na Rua Paraíba, 777); membro efetivo do Sindicato e da Casa dos Economistas de Minas Gerais; delegado eleitor e representante junto ao Conselho Federal de Economia; e diretor financeiro de diversas empresas sediadas em Minas Gerais.

Adjunto de Promotor de Justiça da Comarca de Monte Carmelo, exerceu as funções a partir de 1964 e em toda a era militar, em substituição ao titular, designado para cumprir missão no período. Membro do Conselho Fiscal das Companhias Força e Luz e Telefônica de Monte Carmelo.

Ingressou no Rotary Club Belo Horizonte – Oeste em 24.08.1983 e se desligou em 10.06.2020, tendo exercido os cargos de membro e diretor das comissões permanentes; Vice-Presidente da Casa dos Rotarianos; representante do Governador junto aos Clubes de Rotary; delegado eleitor nas conferências distritais; 1º e 2º vice-presidente; 1º e 2º Tesoureiro; 1º e 2º Secretário e Presidente no ano rotário de 1994/1995.

Maçonaria

         A Maçonaria tem destaque especial em sua vida. Iniciado na Loja Maçônica União Carmelitana de Monte Carmelo em 02.03.1963 e filiado na Loja Maçônica General Moreira Guimarães, 23.08.1974, é membro ativo das duas lojas. Parceiro fundador das Lojas Maçônicas Cavaleiros Templários e Coronel José Persilva em Belo Horizonte, nas quais exerceu vários cargos, como Vigilante, Secretário, Orador, Tesoureiro e outros; Trabalho e Justiça de Coromandel (MG). Foi Venerável Mestre por duas administrações nas três Lojas e secretário em todas elas.

Parceiro fundador do Colégio Comercial Monte Carmelo, em Monte Carmelo e da Academia Mineira Maçônica de Letras (AMML), Cadeira nº 7, que tem como patrono Salvador Carvalho Gurgel do Amaral, e Cadeira nº 1, patrono Joaquim José da Silva Xavier (Tiradentes), na qual é membro efetivo e foi presidente por dois mandatos e os cargos de vice-presidente, secretário e tesoureiro. Pertenceu à Ordem dos Cavaleiros da Inconfidência Mineira de Minas Gerais, à Associação dos Graus 33º do Paraná e à Confederação Maçônica do Brasil.

Membro do Conselho Fiscal, foi Vice-Presidente, Secretário e Presidente, por três mandados, da Excelsa Congregação dos Supremos Conselhos do REAA do Brasil; Secretário da Confederação Pan-Americana dos Supremos Conselhos do REAA; e Presidente, por cinco vezes, no Consistório dos Príncipes do Real Segredo em Belo Horizonte. Foi ainda Orador, Chanceler, membro das Comissões Permanentes e Soberano Grande Comendador do Supremo Conselho do Grau 33 para a República Federativa do Brasil, REAA, no período de 2003 a 2017; Ex-secretário do Sublime Capítulo Rosa Cruz Pelaio Alonso Perez, de Monte Carmelo; Secretário e parceiro na fundação da Sociedade dos Amigos da Marinha (Soamar), em Belo Horizonte.

Membro honorário, ex-membro efetivo e Mestre de Cerimônias do Supremo Consiglio dei Sovr. Gr.’. Isp.’. Gen.’. Del 33º Ed Ultimo Grado, Giurisdizione D’Itália (Supremo Conselho da Itália, em Nápolis) e portador da Medalha nº IV Ordine Cavalleresco da Amistade REAA; e membro honorário do Supreme Conseil de France dês Souverains Grands Inspecteurs Generaux Du 33º ET Demier Degré Du Rite E’Cossais Ancien Et Accepté.

Vice-Presidente, orador, secretário, presidente de comissões permanentes e presidente, por cinco mandatos, da Soberana Assembleia Legislativa do Grande Oriente de Minas Gerais; foi Grão Mestre Adjunto e Grão Mestre Honorário de Honra Ad-Vitam do Grande Oriente de Minas Gerais; Presidente e secretário do Conselho de Grão Mestres; Presidente do Grêmio de Estudos Maçônicos; e orador do Conselho de Veneráveis da I Região do GOMG. Interinamente, por período curto, exerceu por duas vezes o Grão-mestrado do GOMG.

Parceiro na recuperação das atividades do Supremo Consejo Masônico de Cochabamba, Bolívia; e atualmente é Soberano Grande Comendador de Honra do Supremo Conselho de Minas Gerais.

Triângulo Mineiro

Como o Governo de Minas Gerais ignorava e não assistia o Triângulo Mineiro, participou, em 1964, de um grupo de líderes de Uberaba, Uberlândia, Monte Carmelo, Patrocínio e Araguari que iniciou um movimento para transformar o seu território em Estado. “Cada dia crescia o interesse de seus habitantes para essa iniciativa”, disse. O Governo Federal, para evitar o prosseguimento dessa campanha nomeou o dr. Rondon Pacheco para o cargo de Governador do Estado.

Como filho da região, ao assumir o cargo ele atendeu todas as reivindicações, “por serem justas”, como anotou. Posteriormente, com a decisão de dividir a região em Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, enfraqueceu a luta regional, para transformar o Triângulo em Estado.

 

Recordações

Cronista de boa memória, Sebastião tem muitas anotações, como a de que nasceu à beira de um córrego na fazenda do tio-avô Landulfo Cardoso Naves, irmão de sua avó Luiza Cardoso Naves, em um rancho de pau a pique construído pelo seu pai. Era um modelo de habitação de paredes de pau roliço em pé, teto de madeira roliça e cobertura de folha de baguaçu – coqueiro que produz cachos com cocos de cor vermelha escura e muito abundante na região; o cacho é composto de casca dura, coberta de uma massa mole e com castanha. O chão era de terra batida; diariamente precisava ser molhada para não levantar poeira quando as pessoas andavam por ali.

A cama era feita de pau roliço, com colchão e travesseiro recheados de palha de milho ou de capim seco. O banho era feito no córrego, geralmente pelos adultos, e às vezes na bacia; estas se destinavam mais às crianças; com água morna na bacia de alumínio, metal ou em gamela feita de madeira. “Chuveiro ainda não havia sido descoberto por lá”, recorda-se.

Anotou, inclusive, episódios de antes de seu nascimento. Como os dois primeiros irmãos, Maria Terezinha e Geraldo, faleceram logo após nascerem, a tia Ana Rosa Naves, conhecida como Sindoca, foi morar com os pais dele, para ajudar, pois a irmã dela, Anéia, estava grávida dele, Sebastião, e ficou na família; seu pai, Vicente Fernandes da Silva, faleceu quando a filha caçula, Vicentina, ainda não tinha nascido. Com essa perda, Sindoca dividiu com Anéia as responsabilidades pela casa.

Entre as lembranças, conta que a irmã Dorinha nasceu de sete meses no garimpo Goiabal, no distrito de Joaquim Antônio, em Estrela do Sul, MG. Por ter nascido muito miúda, os garimpeiros que a visitavam começaram a chamá-la de Chibiu (pequeno diamante). O nome dela, Maria Helena, veio de uma música de muito sucesso na época.

A irmã caçula Vicentina nasceu na sede da fazenda de Landulfo dois meses após a morte de seu pai. Desse garimpo se mudaram para Boqueirão, no município de Monte Carmelo, que, após se tornar distrito, passou a se chamar Douradoquara; mais tarde foi emancipado como cidade. Nesse local a casa era de telha comum e de barro e as paredes de tijolos, cedidas sem nenhum custo pela sua prima Anita e seu marido Eucério.

Mudanças

Vicente foi peão, amansador de cavalos, carreiro e garimpeiro. Com a insistência do tio Alvim para que transferisse sua residência para São Paulo, ele resolveu visitá-lo para verificar essa possibilidade. Na volta, faleceu no dia 11 de outubro de 1937 na cidade vizinha de Araguari. Ele tinha a doença de Chagas. Na viagem estava acompanhado pelo seu primo Alírio. Na hospedagem em Araguari ele faleceu à noite, dormindo. O corpo foi enterrado nessa cidade mineira, túmulo nº 33.

A notícia da morte de Vicente foi transmitida ao tio Landulfo Naves pelo primo Alírio, pois ele não teve coragem de falar com Aneia, que estava grávida, sete meses, de sua filha Preta. Essa comunicação só foi dada 15 dias após a sua morte; Landulfo levou todos para morar na fazenda dele, onde nasceu a caçula, dois meses depois, originando a homenagem do nome dele para a filha, Vicentina.

Aneia Naves permaneceu casada apenas 10 anos e viúva por 18, pois nasceu em 1906 e faleceu em 26.07.1955.

Solidariedade

Com a transferência de residência para Monte Carmelo dos tios-avós Ronan e Coriolano e da prima Anita, logo em seguida, em dezembro de 1938, também foram para a cidade, onde moraram de aluguel. Algum tempo depois o dr. Dimas Resende Monteiro, promotor de Justiça, casado com Geralda Cardoso, filha de Joaquim Cardoso Naves, irmão de Luiza Naves, fez uma campanha entre os tios e primos e comprou uma casa na praça do Rosário e deu de presente a ela e aos filhos. Em 1950 a casa foi vendida e adquirida a da rua Porto Alegre com a av. Paranaíba.

Para o sustento da família, Sindoca Naves costurava calças masculinas para uma alfaiataria; Aneia lavava roupa para os parentes; e Sebastião vendia verduras, era sacristão e engraxate. Depois foi bancário e balconista de loja de tecidos, por algum tempo, e finalmente auxiliar de cartório. A solidariedade era uma característica nessa convivência. Como exemplo, o tio Manoel Naves de Oliveira (Neca) periodicamente mandava uma banda de porco, arroz e feijão. Ele tinha um pequeno comércio em Douradoquara e seus filhos moravam com as irmãs dele. Ilza Cardoso, prima, pegava os ternos do dr. Geraldo, seu marido, que não mais eram usados e mandava para a Sindoca que os desmanchava e fazia roupa para o sobrinho. Outra prima e irmã da Ilza, Geralda Cardoso, enviava as roupas que sua filha Ada não mais usava e que as transformava em roupas para as duas sobrinhas.

“Dessa forma nós sobrevivemos com conforto e como gente de posse”, relata Sebastião, sempre com bom humor. “Ninguém percebia que essas roupas eram feitas de roupas usadas. Os nossos parentes nos tratavam com carinho, com respeito e como iguais a eles. Nunca nos consideraram inferiores. Por isso, essa família de Cardoso é querida por seus membros. A tia Sindoca e a minha mãe usavam muita roupa das primas”.

Casas

Outra lembrança que o marcou: em 1942 “a tia Clarinda, esposa do tio Neca, faleceu e deixou três filhos: Lívio, Ronald e Renild, todos pequenos, com dois a seis anos. A tia Sindoca foi a Douradoquara, onde eles moravam, e os trouxe para serem criados por ela e minha mãe”. O que de fato aconteceu.

“Todos nós deixamos nossa casa após os casamentos de cada um. Por isso nos consideramos irmãos e os nossos filhos como sobrinhos”, afirmou. “Quando me casei com a Lilita, o Lívio, meu primo e irmão, comprou uma casa em frente ao sr. Joaquim Veloso e ali passamos a morar (onde o Tulio nasceu). Algum tempo depois havia uma casa velha na rua Porto Alegre com Av. Paranaíba à venda; os tios de minha esposa (Miguel, Joel e João) a compraram e nos deram de presente”, relata. “Depois ela foi desmanchada (com muita dificuldade) e edificada”. Nessa casa nasceram: Marcelo, Vicente, Lysia “e no Hospital do dr. Artur o Hermes”.

Em setembro de 1971 “a tia (de minha esposa) Zizinha esteve em nossa casa em Monte Carmelo e nos mostrou uma penca de chaves e a balançou na minha frente e da Lilita. Vim informar a vocês que recebi as chaves de um apartamento que comprei em Belo Horizonte e se vocês forem para lá ele será de vocês por minha doação”. Em janeiro de 1972 “nós arranchamos em Belo Horizonte, até os dias de hoje, e ela cumpriu a promessa”.

Estudos

Técnico em contabilidade, Sebastião participou como sócio do escritório com Lívio Melo Naves e Vicente Peres; com a saída do Lívio, que se casou e foi para Araguari, os remanescentes admitiram Edson Cardoso e Vicente Resende na empresa. “Antes, fui parceiro do Veridiano Cardoso numa fábrica de queijo, que não deu certo”, conta.

Em Monte Carmelo exercia o cargo de Juiz de Direito o dr. Oswaldo Bernardes da Silva, muito amigo deles. Ele era professor nas faculdades de Direito e de Economia em Uberlândia. Em 1964, num sábado, quando os quatro sócios do escritório estavam em um bar “bebericando cervejas”, ele chega, senta e disse que queria ter uma conversa com eles, que prontamente responderam: “Somos todos ouvidos”.

– Matriculei vocês na Faculdade de Ciências Econômicas e terão de ir no próximo sábado para assinar as matrículas”, afirmou.

Surpresos, disseram que não tinham condições, explicando que tinham deixado a escola há muitos anos e não havia possibilidade dessa volta.

Ele, autoritário e secamente, disse:

“Estão intimados e assunto encerrado. Sábado vocês estarão lá”.

Foram da primeira turma de economistas da faculdade.

As dificuldades de locomoção, exercício da profissão e os estudos tiveram que vencê-las. “Certa noite, quando de nosso retorno de Uberlândia, a minha Vemaguete atolou no barro da estrada próxima de Araguari e ali tivemos que dormir dentro dela, com chuva à vontade, até que conseguimos ajuda no dia seguinte”.

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