Viajar é sempre um prazer, e ainda mais quando tudo dá certo, sem contratempos, servindo para comparativos e reflexão sobre o turismo, essa grande indústria que se expande e dá oportunidade de crescimento a todos. A recente viagem ao Peru foi assim, sem ressalvas.
Com 1.285.216 km², o terceiro maior País da América do Sul, tem três regiões: a zona costeira, as montanhas dos Andes e a selva amazônica. Sua população, em torno de 28 milhões de habitantes, é de origem multiétnica e mestiça, com ascendência européia, africana e asiática.
A mistura de tradições culturais resulta de uma ampla diversidade de expressões nos campos das artes, da literatura, da música e da gastronomia. O idioma principal e mais falado é o espanhol; um número significativo de peruanos fala diversas línguas nativas, como o quechua e o aymara. As principais atividades econômicas são a exploração mineral, a agricultura (apenas 13% das terras são próprias para cultivo) e a indústria têxtil, com o turismo ganhando espaço expressivo.
Esse intróito oportuniza um paralelo entre Goiás e esse país andino, que valoriza sua cultura, suas tradições, suas incríveis belezas naturais e se estrutura para bem atender os visitantes, transformando cada ponto, por mais simples que seja, num atrativo turístico.
Um País pobre, de enormes contrastes sociais e econômicos, dá uma lição: o peruano se apresenta alegre, simpático e de forma humilde a quem chega, atencioso e conquistando a todos. A segurança, nos principais centros, é nota 10, com um ou dois policiais em cada esquina, circulando; há pedintes, mas em número reduzido; e todos querem oportunidades: de crianças a adultos, muitos se apresentam com suas llamas, de todos os tamanhos, para serem fotografados em troca de “propina”, ou seja, gorjeta no valor correspondente a um sol (o dólar, neste mês, vale 2,8 soles).
Da primeira parada, em Arequipa, alguns dados importantes: situada numa área quase desértica, a 2.700m do nível do mar, a região aproveita cada espaço disponível para plantar e colher milho e hortaliças. Próximo à cidade há três grandes vulcões, de cuja lava produzem material para a construção civil, forte e resistente, cuja coloração tornou-a conhecida como “Cidade Branca”. Com mais de um milhão de habitantes, tem um trânsito atípico: 90% dos veículos que circulam são do transporte coletivo, como táxi; a sinalização é mínima, e os acidentes são raros. A buzina é o instrumento mais tocado, ali e em outras cidades peruanas, seja para cumprimentar, para o taxista anunciar que está vazio ou mesmo para pedir passagem; a maioria dos motoristas é formada de apressados, num trânsito que parece desordenado, mas sem acidentes. A comida é saborosa, a preços acessíveis, e o vinho tinto é muito bom, como “Tacama” e “Tabernero”. À chegada do visitante, já o orientam quanto à altitude, que traz dores de cabeça, enjôos e dificuldades para andar e oferecem, em todos os locais e de imediato, um chá de coca, para melhorar a respiração.
Destino seguinte, Cusco, a 3.300m do nível do mar, com mais de 350 mil habitantes, oferece muitas opções e é mais dinâmica, com seus 17 templos católicos suntuosos, erguidos pelos colonizadores espanhóis. Valoriza a história dos incas, que fica num Museu no centro da cidade, que vale a pena conhecer: mostra esse povo que viveu entre os anos de 800 e 1530 da era cristã, com uma estrutura que serve de referência, em termos políticos, sociais e econômicos. A região chegou a ter 12 milhões de habitantes, distribuídos de forma organizada, não havia fome e a cada 30km o viajante tinha o que chamavam de “tambo” – uma pousada para se alimentar e aos animais, descansar e prosseguir viagem; essa distância foi definida porque o homem, com a sua llama, animal que suporta uma carga de até 30kg, conseguia fazer esse percurso num dia.
A viagem a Machu Picchu, que fica na região, é feita de trem, que vai a 20km/h, de forma monótona, mostrando belas paisagens. Em Águas Calientes, a 2.000m do nível do mar, o visitante se deslumbra com as montanhas; os 400m para se atingir o topo da montanha que dá nome à área, Machu Picchu, são percorridos em ônibus, por caminhos estreitos e perigosos, durante 25 minutos de emoção e sofrimento para quem tem medo de altura. Lá, o visitante dedica em torno de três horas para subir as escadas intermináveis e conhecer aquele exemplo de espaço social construído há séculos no alto da montanha, com estrutura para produção, estocagem e distribuição de alimentos, e retornar. Quem se interessa, no segundo dia apenas 400 pessoas, que chegarem primeiro, são selecionadas para escalar uma segunda montanha, com mais 500m e a essa visita dedicam em torno de cinco horas, num passeio de beleza indescritível e que exige bom desempenho físico.
O terceiro roteiro leva a Puno, na divisa com a Bolívia, onde se atravessa o enorme Lago de Titicaca, situado entre os dois países e que abriga, em suas quase 60 ilhas, uma reduzida população de índios, com seus costumes, cultura e tradições. Apresentam-se amistosos, alegres e descontraídos; numa das ilhas, as mulheres cantaram músicas regionais para agradecer a visita. Vivem de seu artesanato e da pesca.
O último roteiro desta viagem é Lima, a bela e simpática Capital, com seus contrastes enormes, história, tradição e valores preservados, que são referência.
Este roteiro, curiosamente, foi escolhido pelo meu filho caçula, Jales Júnior, 22 anos, que nos acompanhou (Heloísa e eu) nessa feliz coincidência: era o mesmo que eu, aos 23 anos, regressando de um curso de especialização em Quito, no Equador, fizera em 1973. Hoje as diferenças são enormes, e com estruturas de apoio mais amplas e dinâmicas, mais favoráveis ao visitante. Jales Jr. conheceu, nessa viagem, dezenas de jovens europeus por onde passou e fez uma constatação que merece uma reflexão: eles programam seus roteiros pela América Latina sem incluir o Brasil.
Um exemplo de profissionalismo foi oferecido pela Coor Travel, agência de turismo que nos deu assistência no País: na chegada a Cusco, enviou um táxi para nos levar ao hotel, devido a um incidente com a van; depois, sentindo a nossa reação de desagrado, fez questão de se desculpar e nos oferecer um jantar. Ainda, como tive um forte resfriado, em função da mudança do clima, intermediou uma consulta médica através do seguro de viagem, explicou a situação e em 30 minutos um médico compareceu ao hotel, para um diagnóstico, já levando os medicamentos, que foram precisos em resolver o problema.
Há proximidades entre Goiás e Peru e merecem um estudo e uma análise para buscar, ali, referenciais para um trabalho aqui, aproveitando que temos, igualmente, belezas naturais, uma história que está sendo escrita e precisa ser valorizada, uma gastronomia que não fica a desejar e instituições de ensino superior dedicadas ao turismo.
Artigo publicado no jornal “Diário da Manhã”, de Goiânia, GO, edição de 17.07.2010, Pág. 9 / Esportes