Jales Mendonça abrindo o lançamento do livro no IHGG (Foto de Nelson Santos)
Um dos frutos do estágio pós-doutoral realizado no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o livro “História cultural da Imprensa goiana no século XIX”, das professoras Rosana Maria Ribeiro Borges e Marialva Carlos Barbosa, lançado nesta quinta-feira, dia 16, no Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, resgatou um período pouco conhecido dessa época. A intenção do estudo era construir uma leitura analítica e sintética da história da imprensa goiana, com recorte na trajetória histórico-cultural dos veículos de jornalismo impresso – e dos seus sentidos – desde o surgimento do primeiro, em 1830, até os dias atuais. Como é comum em pesquisas de abordagem qualitativa, tão logo o levantamento bibliográfico e a pesquisa documental tomaram corpo revelaram um novo universo dessas publicações.
O lançamento do livro foi uma homenagem à Associação Goiana de Imprensa pelos seus 90 anos, a serem comemorados em 10 de setembro, e ressalta seu papel ao longo da história, acumulando lutas em prol da democracia e da liberdade de informação. “Alicerçado na perspectiva da história cultural, o livro não apresenta uma leitura linear dos jornais e revistas que circularam em Goiás no século XIX, pois dialoga com processos, conjunturas e existências que configuraram esses jornais, construindo narrativas, significações, memórias, simbologias e ações de um tempo passado que edificou o presente vivido”, afirmou Rosana, professora do Curso de Jornalismo da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás e coordenadora do Grupo de Pesquisa ‘História da Comunicação em Goiás’, cadastrado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
O presidente do IHGG, Jales Mendonça, elogiou a obra, dizendo que tinha começado de ler o trabalho, gostou das partes que folheou e destacou a importância da pesquisa e de sua divulgação, como aquele livro, que abordou aspectos pouco conhecidos dos goianos e da história de Goiás. Também falou o presidente do Instituto Cultural e Educacional Bernardo Élis para os Povos do Cerrado, Nilson Jaime.
Rosana autografa o exemplar do jornalista Valterli Guedes (Foto de Nelson Santos)
Primeiro jornal
Para o presidente da AGI, Valterli Guedes, ao apresentar a obra, foi graças à ambição expansionista de Napoleão Bonaparte que o primeiro sistema impressor desembarcou no Brasil, em 1808, trazido por dom João VI, rei de Portugal. Temeroso da invasão das tropas napoleônicas, ele partiu rumo ao Brasil, em fuga, sob a escolta da Marinha inglesa. “Na bagagem era conduzida a estrutura da imprensa régia”, disse. Apenas 22 anos depois, em 5 de março de 1930, por iniciativa de Joaquim Alves de Oliveira, nascido em Pilar de Goiás, comendador do Papa e notável empreendedor, circulou o primeiro jornal do Centro-Oeste e um dos primeiros do Brasil, “Matutina Meiapontense”, que fundou na então Meia Ponte, atual cidade de Pirenópolis.
“Um marco e tanto”, disse. Explicou que, na atualidade, o jornal é mencionado e estudado com tanta frequência que, para muitos, teria sido, senão o único, um dos raros órgãos de imprensa goiana durante todo o século XIX. “Torna-se importante ressaltar que, no período objeto deste estudo, foram lançados no território goiano 55 jornais e três revista”, completou.
Esclareceu que esse livro “é, até agora, a principal contribuição aos que queriam compreender aquela fase da história de Goiás sob todos os aspectos, a partir dessa importante fonte, que é a imprensa. Temas como combate à escravização, por exemplo, são abordados na respectiva obra, e dessa abordagem emergem figuras da maior relevância, a exemplo de Antônio Félix de Bulhões Jardim e de José do Patrocínio Marques Tocantins, de cujo empenho e dedicação, conforme consta na obra, fez com que algo excepcional fosse concretizado: antes da promulgação da Lei Áurea, pela Princesa Isabel, já não existiam mais pessoas escravas na capital da Província de Goiás.
Outras importantes bandeiras foram defendidas pelos jornais goianos do século XIX, a exemplo dos esforços pelo fim daquela que foi a única Monarquia das Américas, e que chegou ao fim em 1889, ano em que se seguiu ao fim da escravidão no Brasil. “Esta é, portanto, uma obra reveladora, que lança luz sobre os órgãos da imprensa de uma época em que jornais e revistas eram os únicos meios de comunicação”.
Conteúdo
O livro não foca apenas os impressos, abarcando existências de pessoas que produziram jornais e de várias maneiras dialogaram por meio de cartas de leitores, opinativos, anúncios e outros gêneros textuais presentes em suas páginas. “O contato com essas pessoas e o que elas perenizaram foi, por vezes, permeado por afetividades que se remetem a sentimentos quase inexplicáveis”, explicou.
No primeiro capítulo a análise das dinâmicas históricas e das contradições que antecederam as atividades impressas em Goiás, com foco na reocupação deste pedaço de sertão e no comendador Joaquim Alves de Oliveira, proprietário da primeira tipografia goiana, que deu origem ao primogênito impresso no Estado e no Centro-Oeste brasileiro. No segundo, o surgimento do periódico e seus conteúdos, diálogos e significações de um contraditório tempo histórico. No terceiro, o foco foi a imprensa oficial, que, desde o surgimento, tanto conformou uma arena pública de debates no território goiano, quando oscilou entre o público e o privado nas dinâmicas de poder que acompanham o cenário político.
As principais discussões do quarto capítulo giram em torno da explosão do Jornalismo goiano a partir de 1840, um reforço à percepção de que o campo simbólico sempre esteve em constante disputa. Ainda, tem um jornal, provavelmente manuscrito, editado em Goiás durante o desterro de Francisco Sabino; a imprensa vanguardista que, em 1855, defendia o casamento entre mulheres e o divórcio e os primeiros jornais noticiosos, partidários, comerciais, juvenis, estudantis, literários e femininos de Goiás. No quinto capítulo, o debate sobre o abolicionismo, a República e a insurgência nos periódicos goianos oitocentistas. Também, as três primeiras revistas goianas: “Azylo da razão”, com os ideários maçons e abolicionistas; “A Cruz”, católica; e “Revista Central”, desenvolvimentista.
Prestigiando a mãe, os quatro filhos de Rosana (Foto de Nelson Santos)