Reedição de livro pioneiro resgata a história da imprensa em Goiás e sua contribuição no período de 1830 a 1946
Principal instrumento da sociedade para a garantia da democracia, a imprensa tem cumprido seu papel. Em sua trajetória em Goiás, de 187 anos, desempenha função de fundamental significado na construção de nossa história, ao registrar os principais acontecimentos, discutir as questões de grande relevância e se posicionar frente aos mais diversos problemas e situações.
De diferentes ideologias e com bandeiras as mais diversas, esses veículos de comunicação assumiram seu ofício e o desempenham com convicção e entusiasmo. Lutaram pelo direito à informação e pela liberdade de expressão. Em Goiás, mais enfaticamente, dedicaram-se à promoção do desenvolvimento e defenderam lutas específicas, como o abolicionismo, a doutrina católica e a causa maçônica. Foram elaborados por intelectuais, por mulheres, por partidos políticos e por jovens. E, principalmente, mantiveram acesa a questão política, sempre presente.
É o que José Lobo relata neste pioneiro livro, “Contribuição à História da Imprensa Goiana”, que resgata os títulos, faz um resumo, com rápidos comentários sobre a linha de cada publicação, e indica quem conduziu os primeiros jornais goianos. Ele próprio o considerou um trabalho incompleto, com uma assertiva: servir de base para quando for escrita a história integral da imprensa de Goiás.
Jornal é “fiel registro da história”, complementou Lobo, explicando que esse meio de comunicação não se limitava a transmitir o depoimento dos contemporâneos. Evidenciou, na obra, um detalhe de representativo valor histórico: a goiana é uma das imprensas mais antigas do país, que começou na antiga Meia Ponte, em 1830, apenas 22 anos depois da circulação do primeiro jornal brasileiro “Correio Braziliense”, produzido em Londres, em 1º de julho, e do primeiro jornal impresso no Brasil, “Gazeta do Rio de Janeiro”, de 10 de setembro, ambos de 1808, e foi se espalhando, devagar, pelas demais regiões.
Rico em informações, num levantamento minucioso sobre o que foi publicado em Goiás a partir do primeiro jornal “A Matutina Meiapontense”, indicou os jornais oficiais, que vieram na sequência para registrar os principais fatos do Poder Público, e os demais que foram criados na sequência. Enumerou mais de 100 títulos, alguns repetindo nomes, editados nas duas capitais, a antiga Vila Boa e Goiânia, e em mais de 20 cidades do interior.
Um dado interessante, diante desses números muito significativos de jornais e revistas, é que Goiás viveu, ao longo desse período, uma fase de atraso e de isolamento, por ser um lugar distante dos grandes centros econômicos, de difícil acesso e com poucas condições para o seu desenvolvimento. Quadro construído com base em relatos de viajantes europeus, que retratavam, em seu olhar, a decadência a partir do fim do ciclo mineratório, ao registrar aquela realidade econômica e social de Goiás.
O professor Nars Fayad Chaul, em sua obra “Caminhos de Goiás: da construção da decadência aos limites da modernidade”, dá outro sentido para a discussão sobre esse atraso: “na sociedade goiana do pós-mineração houve o esgotamento de uma forma de produção e a sua substituição por outras atividades econômicas sem que isto tenha implicado em decadência propriamente dita”.
Em artigo na revista “Informação Goiana”, de 1917, Victor de Carvalho Ramos analisou a situação do sistema de ensino à época, constatando o descaso do Poder Público em relação aos níveis primário e secundário. Registrou que Goiás se destacava como o Estado com o maior índice de analfabetismo do país, explicando que os gastos com instrução pública eram insuficientes.
Jaqueline Veloso Portela de Araújo, no trabalho “Memória e história da educação em Goiás”, ressalta que nas primeiras décadas do século XX o nosso sistema educacional era bastante incipiente. Havia obrigatoriedade de escolarização para as crianças com idades de 7 a 14 anos, que deveriam freqüentar escolas públicas ou particulares, ou ainda, serem instruídas em casa por suas famílias. Citou, nessa análise, a professora Nancy Ribeiro de Araújo e Silva, em seu livro “Tradição e renovação educacional em Goiás”, de 1975, para quem o provimento do ensino em família figura na história da educação em Goiás como uma modalidade de instrução elementar que prevaleceu nessas duas décadas.
Nos documentos pesquisados, conforme explicou Jaqueline, não foi possível verificar, nesse período, preocupações do Poder Público referentes à educação de crianças residentes no meio rural, “embora se possa supor que grande parte da população de Goiás residisse no campo e não fosse alfabetizada”. Citou Vanilda Paiva, em sua obra “História da educação popular no Brasil: educação popular e educação de adultos”, de 2003, de que, com base em dados do Censo de 1920, em Goiás 98% da população eram analfabetos.
É justamente nesse período de atraso e isolamento que surgem os jornais e José Lobo os relaciona, mesmo sem analisá-los de uma forma mais ampla.
As mudanças na vida do goiano começaram a ocorrer, efetivamente, ao longo da primeira metade do século XX, quando a economia ganhou uma base agropastoril e passou a contar com nova estrutura de transporte, com a implantação da estrada de ferro. São citados ainda, como fatores que somaram nessas transformações, a transferência da capital, a Marcha para o Oeste e o incentivo governamental para a ocupação das terras.
Ao completar 45 anos de sua formatura, a segunda turma do Curso de Jornalismo da Universidade Federal de Goiás (1969-1972) decidiu dar sua contribuição: reeditou esta obra, a primeira sobre a imprensa goiana, e até então pouco conhecida nos meios universitário e jornalístico, pois completou 70 anos e é de uma época em que as tiragens eram pequenas e a circulação limitada.
A intenção, ao relançar a obra pioneira, é valorizá-la em seu contexto, ilustrá-la, trazer novos dados e buscar compreender melhor cada etapa de nossa história, que passa a ser melhor conhecida das novas gerações.
É uma contribuição de grande valor neste momento em que se busca o resgate de projetos e iniciativas que ajudaram na construção de Goiás. O livro, certamente, além de pioneiro, foi importante e de valia muito significativa.